[conjunto vazio]

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Respostas ao texto “Pixação: questões sobre arte, mercado e práxis”

In blog on abril 26, 2010 at 10:15

Reproduzimos abaixo um e-mail de Djan Cripta em resposta ao texto “Pixação: questões sobre arte, mercado e práxis“,  achamos que é extremamente relevante publica-lo aqui pois problematiza questões ainda obscuras e relevantes da questão . Além disso, esse e-mail corrige algumas informações erradas do texto anterior e exibe a visão de alguém que está totalmente imerso na pixação.

Outra resposta ao texto do [conjunto vazio], dessa vez sob uma perspectiva de revelar o que é o desejo por trás da crítica e questionar o proprio posicionamento do coletivo , pode ser encontrada aqui .

“Salve Coletivo (CV).

Meu comentário foi mais em questão de algumas colocações erradas de vocês sobre nos, Não somos o coletivo Sustos, Sustos é o nome de uma das turmas ou gangs como preferirem, Sustos é a turma que a Caroline faz parte.
Nossa revolução foi batizada de “Alem do Bem e do Mal”, varias turmas da pixação paulista resolverem se juntar a essa causa após receberem um convite que foi distribuído em points de pixadores, o mentor intelectual de todos os ataques foi o Rafael Pixo BomB porem ele precisou da minha influencia com vários pixadores para executar os ataques, eu sou conhecido por Cripta Djan entre os pixadores, foi levantando o nome da turma Cripta que fiquei conhecido no movimento.
Eu e Rafael que sempre pixamos e escalamos prédios juntos nos juntamos nessa revolução, eu como líder das ações e Rafael como mentor intelectual, vou explicar o motivo de todos os ataques para que vocês entendam melhor.

Dez do primeiro ataque nosso propósito foi o de resgatar o lado contestador da Pixação que estava perdido e inserir o movimento em uma discussão no meio artístico, começamos pelo meio acadêmico que acabou rejeitando a tese de RAFAEL PIX BOMB que defendeu em seus quatro anos de estudos na Faculdade de Belas Artes a Pixação como forma de expressão artística.
A Galeria Choque Cultural sempre disse ser a única representante da arte de Rua do Brasil, e que não tinha preconceitos com nenhum tipo de expressão urbana, então demos a eles uma verdadeira exposição de Pixação dentro do contesto do movimento que é a ilegalidade, a resposta deles foi prestar uma queixa crime na policia.

A Bienal foi um convite da própria curadoria que declarou que a Bienal daquele ano (Em vivo contato) estava aberta para intervenções urbanas, e a resposta deles foi mandar a Pixadora Caroline Piveta da Motta para cadeia.

Os atropelos aos painéis de Grafites autorizados e financiados e uma cobrança a conduta dos Grafiteiros que se renderam ao sistema e assassinaram o espírito marginal do Graffiti, pois o verdadeiro Graffiti nasceu na ilegalidade e sempre se apropriava de espaços públicos de forma ilegal, alem disso o Graffiti passou a ser usado como antídoto contra a Pixação, já que os donos dos muros empresários e Governantes perceberam que locais Grafitados não eram pixados.

Neste ultimo ataque (Painel de Graffiti dos irmãos Os Gêmeos) entra duas questões, a do Graffiti autorizado e financiado, e da prefeitura estar mais preocupada em maquiar a cidade do que cuidar de outros problemas que a ela tem, independente se o mural foi patrocinado ou não pela Associação comercial de Empresários de São Paulo, essa iniciativa poderia ser tomada para cuidar de outras necessidades muitos mais importantes que a cidade tem, um painel de Grafite não tem utilidade nenhuma a não ser de enfeitar, e do que adiante pintar um local que cheira a bosta e urina humana, onde pessoas dormem na rua convivendo com ratos e baratas, esse projeto cidade limpa é varrer a sujeira da cidade para de baixo do tapete.

A exposição na fundação Cartier em Paris foi um tapa na cara da sociedade hipócrita Brasileira que sempre reduziu a Pixação somente a sujeira e vandalismo, a única obrigação que a Pixação tem é de ser ilegal é na RUA, em outros locais como no caso da Fundação Cartier será somente representativa, e só fiz essa reprodução por que em Paris não existe nossa Pixação, e nada mais justo para a Pixação do que ser lembrada em uma exposição que retratava a historia da arte de rua mundial.

Ao todo participaram dessa revolução cerca de 100 turmas de pixadores, em vista do numero de turmas que existe ainda é pouco, muitos ainda preferem se dedicar somente a seus pixos, esse é um problema, a vaidade atrapalha muito para que aconteça um levante maior, mas estamos lutando pra mudar isso.

No caso de agora estarmos envolvidos nessa Bienal até parece que estamos nos rendendo, mas não vou estragar a surpresa sobre de que forma vamos fazer isso sem cair em contradição.

Qualquer outra duvida me avisem.

Abraço”

Pixação: questões sobre arte, mercado e práxis

In blog on abril 21, 2010 at 19:30

A quem interessa uma inserção mercadológica e um status de arte da pixação*?

O que antes era considerado vandalismo e um ato criminoso começa a ser visto e reivindicado como produto artístico. Podemos observar tal fato se lembrarmos do livro “Pixação: São Paulo Signature” do pesquisador, arquiteto, designer gráfico, tipografo e fotografo francês, François Chastanet, que foi à São Paulo catalogar as letras espalhadas em muros e prédios, lançando este livro, que expõe a tipografia e caligrafia da pixação. Fato semelhante ocorreu com o livro “Ttsss… a Grande Arte da Pixação em São Paulo, Brasil“ organizado pelo pixador Boleta, considerado um dos maiores nomes do gênero. O livro é vendido como o “primeiro grande livro de arte de vanguarda” e tem grande aceitação na Alemanha, Estados Unidos, França, Espanha e Holanda. Lá fora a pixação já é considerada uma arte e é vista por alguns como artigo de exportação, o que seria comprovado com a recente camisa de futebol da seleção brasileira, feita pela Nike, em que se utilizou a estética do pixo.

 

Nunca x Nike Sportswear "Team Brazil" Pack

Design: Nike Sportswear

 

A questão parece ser ainda mais relevante se analisarmos as últimas ações organizadas pelo Susto’’s e o recente anúncio da participação de pixadores na 29ª Bienal Internacional de Arte de São Paulo. Estes acontecimentos levantam importantes indagações sobre a comercialização e o apaziguamento do caráter subversivo da pixação. Isso não parece surpreender aqueles que já acompanham os desdobramentos de uma polêmica que começa em junho de 2008,  com a invasão de Rafael  PixoBomb (integrante do Susto’’s) à  formatura/exposição da Faculdade de Belas Artes, curso que fazia e que estava prestes a se formar. Pixaobomb acompanhado de outros pixadores intervieram em várias obras de arte que lá estavam e acabaram por entrar em confronto com alunos, familiares e seguranças da galeria, saindo algemados do local. Pixabomb alegou ter sido esse o seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC).

Em setembro de 2008, acontece a invasão da Choque Galeria de Arte, especializada na chamada Street Art. Cerca de 30 pixadores invadiram a Choque e pixaram não só as paredes, como várias obras que lá estavam expostas. A ação foi organizada através de um manifesto chamado “Atack Part 2: A Caminho da Revolução 2008” como uma critica a galeria Choque, que mesmo sendo considerada uma galeria dedicada à arte de rua underground, não abriria espaço e nem exporia obras de pixadores. Sobre essa intervenção, falou-se  até de uma suposta valorização monetária das obras pixadas, como se um maior valor simbólico fosse agregado a elas.

Um mês depois, em outubro de 2008, acontece a invasão da 28ª Bienal de  arte de São Paulo. Cerca de 40 pixadores (integrantes do Susto”s, Secretos e 4) invadiram a abertura da Bienal ao público pixando as paredes do segundo andar que estava propositadamente vazio. Tal ação gerou muita repercussão, principalmente pela prisão da pixadora e integrante do Sustos, Caroline Pivetta.

Um aspecto problemático vem a tona com as ações do Susto’’s. Do ponto de vista de uma atitude antiartística, as intervenções do coletivo parecem extremamente coerentes com uma crítica revolucionária aos padrões de arte dominante. A grande questão recairia sobre os discursos proferidos pelo Susto’’s e, principalmente, pelo  Pixobomb, que remetem sempre a uma tentativa de inserção  no mercado, citando várias vezes sobre como o pixo não é considerado arte ou sobre como apenas algumas pessoas ganham dinheiro com a pixação. É notório como parece haver nessas intervenções um caráter espetacularizado e midiático, gerando sempre a dúvida: é uma oposição/questionamento da arte ou simplesmente uma atitude para que o pixo tenha o mesmo status da arte (e consequentemente tenha o mesmo valor financeiro)? Aparentemente, o que seria uma relação negativa à arte, com ações que levariam a crer em um total desprezo de instituições, obras, artistas e da própria arte,  revela-se marcada pela tentativa de fazer do pixo ele mesmo uma categoria de arte elevada e legítima, em que os pixadores seriam reconhecidos como artistas e, consequentemente, obteriam inserção mercadológica nos circuitos artísticos.

O pretenso discurso revolucionário e questionador do Susto’’s e Pixobomb, afirmando fazer protestos contra a comercialização, institucionalização e domesticação da cultura de rua parece soar ainda mais contraditório e ingênuo após o aceite ao convite da Bienal para a participação de pixadores no evento. O que antes era considerado uma contravenção pelos antigos curadores, que chamaram a ação de “vandalismo agressivo e autoritário”, é visto pelo atual curador da Bienal, Moacir dos Anjos, como um convite ao pensar. Para ele, o pixo borraria e questionaria os limites que separam a arte e a política, fato que  o levou a convidar os mesmos lideres da invasão do pavilhão vazio , em 2008, a expor seus ( agora assim chamados) trabalhos artísticos. A atitude da curadoria nos parece não só esperta, mas extremamente coerente, já que funcionaria como uma forma de expiar a omissão da instituição e sua repercussão negativa no caso da última edição (principalmente pela prisão de Pivetta). Esse “polêmico” convite da curadoria também daria visibilidade ao evento, criando um falso debate que lota jornais, revistas e meios acadêmico ávidos por esse tipo de celeuma. Não é preciso dizer que isso só ajuda a anular o pixo em suas dimensões políticas e de diálogo com a cidade para transforma-lo em apenas mais uma “escola” absorvida na instituição da arte.

Não se trata, aqui de fazer um juízo moral/estético sobre o pixo ou uma tentativa de retirar todo potencial questionador e revolucionário, os quais acreditamos existir nas ações dos pixadores. Concordamos com Baudrillard, que sobre o assunto diz: “A cidade é um “corpo sem órgãos”, como diz Deleuze, um cruzamento de fluxos canalizados. Os pichadores se vêm como aqueles que colocam ordem territorial. Eles se territorializam decodificado espaços urbanos – uma rua, parede ou bairro vem à vida através deles, tornando-se um território coletivo novamente. Eles não se limitam ao gueto, eles exportam o gueto através de todas as artérias da cidade, eles invadem a cidade branca e revelam que ele é o verdadeiro gueto do mundo ocidental “. A pixação é uma atividade em íntimo contato com a cidade, já que o pixador ressignifica violentamente o espaço. Mesmo assim, não podemos nos furtar de indicar que um dos problemas da pixação  reside em seu aspecto muitas vezes bairrista e exibicionista, servindo apenas para reafirmar a  demarcação de um território por um indivíduo ou um grupo. Tais grupos constantemente se organizam na forma de “gangues” com um caráter verticalizado e hostil à outros grupos que também intervêm na cidade.

Para além dessa discussão sobre o caráter positivo/negativo da pixação, é necessário questionar o uso que alguns fazem da pixação, evitando que sua prática se transforme em algo estéril, domesticado e  longe da juventude que já a quase 20 anos faz uso dela como uma forma de diversão e protesto. É através do pixo que eles expressam seu desrespeito ao urbanismo que não contempla a permanência na cidade, tratando-a apenas como um ponto de passagem sem que se favoreça uma real interação entre pessoas e esses locais e, principalmente, não permite que tais jovens, em sua maioria, moradores de regiões distantes dos centros urbanos, vivam a cidade de outras formas que não essa. Então, deveríamos pensar se o que dizem os Amig@s da Próxima Insurreição sobre o Susto’’s e Pixobomb está correto (“…os companheiros do Grupo Susto’s são inimigos da arte moderna e da liberdade artística”) ou se por trás de toda essa prática questionadora exista apenas o desejo de alguns serem integrados ao sistema da arte que aparentemente se opõem? Talvez seja esse o perigo de toda práxis crítica, transformar-se exatamente no que combate!

 

* Utilizamos a grafia “pixo” no lugar de “picho”, conforme o uso que os próprios interventores fazem

A quem interessa uma inserção mercadológica e um status de arte da pixação? O que

Movimentos LGBT: Crítica e Análise

In blog on abril 18, 2010 at 10:43

Cerca de dois séculos se passaram desde o surgimento do que Michel Foucault chama de “dispositivo da sexualidade”. A partir de então, diz o filósofo, os indivíduos passaram a ser qualificados e taxados por normas pedagógicas, médicas, jurídicas, científicas e morais, criadas a partir de um paradigma heterossexual. Dessa forma, o sexo extraconjugal e estéril passa a ser classificado não mais como uma subversão contra legem (infratora da aliança do casamento), mas como uma anomalia, ou seja, um desvio do padrão considerado saudável. Estava, então, estipulado o limite entre o normal e patológico, que guiaria toda a atuação da disciplina sobre os corpos. Os doentes deviam, desse modo, ser tratados e conduzidos em direção à normalidade pelas instâncias do poder disciplinar.

Nesse sentido, a sexualidade se tornava principal fator de subjetivação do indivíduo. O processo de constituição do sujeito passava a ser, assim, determinado por ela. Exemplo disso é a diferença do tratamento direcionado às práticas homossexuais antes e depois da origem do dispositivo. Anteriormente ao século XIX, a sodomia (termo dado pela época às relações homoafetivas) era tão-somente uma infração tipificada pelo antigo direito canônico ou civil, isto é, um crime em que o autor se posicionava como mero agente (um simples sujeito jurídico). No século XIX, entretanto, surge a figura moderna do homossexual. Para Foucault, o homossexual “torna-se uma personagem, uma história, uma infância, um caráter, uma forma de vida; também é morfologia, como uma anatomia discreta e, talvez, uma fisiologia misteriosa. Nada daquilo que ele é, no fim das contas, escapa à sua sexualidade. Ela está presente nele todo: subjacente a todas as suas condutas, (…) inscrita sem pudor na sua face, já que é um segredo que se trai sempre. É-lhe consubstancial, não como pecado habitual, mas como natureza singular”. Desse modo, conclui-se que enquanto o sodomita era um reincidente, o homossexual passa a ser uma espécie anormal. O indivíduo se constituía, com isso, a partir de sua sexualidade, inscrita e marcada em uma suposta “essência”.

Entrecruzadas a esses procedimentos de subjetivação, estão as chamadas práticas discursivas, surgidas e instituídas por meio de um fenômeno nomeado por Foucault de explosão ou proliferação dos discursos. De fato, o francês esclarece que a colocação do sexo em discurso não foi restringida, mas pelo contrário, incitada. As técnicas de poder e a vontade de saber, na verdade, empenharam-se no conhecimento das sexualidades polimorfas e no estabelecimento de uma ciência da sexualidade. As instituições passaram a estimular que o sexo fosse dito, explicita e detalhadamente. Nada mais conveniente para os mecanismos institucionais, uma vez que as definições dos padrões de normalidade só poderiam ser conhecidas se o sexo fosse estudado a fundo, interrogando os indivíduos a respeito de seus mais íntimos segredos – herança evidente da pastoral cristã e seus ritos de confissão. Além disso, o confessar participa de uma sistemática de reconhecimento subjetiva. Isto porque o indivíduo, ao confessar sua sexualidade, pensa-se enquanto sujeito, ou seja, torna-se um sujeito que se reconhece ao admitir sua “natureza”. Logo, a subjetivação do indivíduo pela sexualidade também perpassa as práticas de confissão.

É dentro deste contexto teórico que a atuação dos movimentos de defesa da comunidade LGBT pode se revelar problemática. Logicamente, é indiscutível que eles representam um importante papel social, posicionando-se, quase sempre, contrários à discriminação e à exclusão impingida aos homossexuais. Contudo, a institucionalização desses grupos em um corpo quase partidário faz com que seus membros colaborem para um efeito discursivo presente no pensamento de Foucault: a subjetivação pelo auto-reconhecimento. Quando alguém se ”filia” a uma organização dessa natureza, constitui-se sujeito a partir de sua sexualidade, ou seja, ”confessa” que é “homossexual”, sendo este fato o principal fator constitutivo de sua personalidade. Algo, convenhamos, muito conveniente às redes de poder, que se empenham na classificação e especificação dos indivíduos. O sujeito se torna uma espécie desviante do paradigma normativo. Aliás, outro ponto controverso relacionado ao movimento gay está justamente ligado a esse “paradigma normativo”. Os grupos de defesa dos homossexuais reivindicam, necessariamente, direitos civis de inspiração heteronormativa, como o casamento e a adoção de crianças. Essas reivindicações transparecem uma busca por um tipo de adequação ao padrão normal social heterossexual.

Tal empenho colabora com os procedimentos de docilização dos corpos e ”normalização das aberrações” que há séculos vêm sendo formulados e aplicados pelas instâncias do poder disciplinar. Como conseqüência, essa incessante luta por uma assimilação da heteronormatividade, torna os gays marionetes de uma campanha que apresenta interesses ocultos das parcelas privilegiadas da sociedade, e que não afasta o modelo de supremacia masculina heterossexual arraigado. Desse modo, os homossexuais são ”assimilados”, mas continuam sendo valorados de forma inferior àqueles que seguem o padrão normalizador (heterossexismo). Assim, em última instância, a campanha pelos direitos LGBT termina cooptada e controlada por setores de dominação como a mídia.

Além disso é notório uma forte questão mercadológica envolvendo o LGBT, como se a  partir da sexualidade todo um comércio se abrisse. Os homossexuais passam a ser vistos como consumidores de produtos, bens e serviços de lazer e entretenimento, conceituado teoricamente um novo  e lucrativo nicho de mercado.  Para citar um exemplo desse processo, pacotes e eventos ditos GLS,  aumentaram as vendas em 40% no setor de  Turismo no Brasil, sem contar boates e restaurantes destinados apenas ao público homoafetivo.  Tal “segmento” é visto por vários especialistas como o nicho de maior  potencial comercial da atualidade. Assim,  o movimento LGBT deixa de ser algo político para ser visto apenas como mais um segmento mercadológico, aquietando seu potencial de luta efetiva .

Não se quer dizer com tudo isso, absolutamente, que os homossexuais não devam reivindicar pelos seus direitos. Pelo contrário, isso deve ser feito. Porém, cabe pensar que nem todos os movimentos o fazem de maneira realmente subversiva. Lutar por igualdade sexual passa por fatores bem mais complexos do que a mera assimilação. O erro dos grupos de defesa da comunidade LGBT está, justamente, na crença de que os gays se adequarão ao modo de vida machista e heterossexual predominante na nossa sociedade. Com esse pensamento, o homossexual se rende ao rótulo de parte dominada e anômala dado pela disciplina àqueles que se desviem do paradigma. O indivíduo confessa, produz um discurso, torna-se sujeito pertencente a uma espécie e, a partir disso, é docilizado, domesticado para que depois seja ‘normalizado’ e disciplinado (práticas subjetivadoras e discursivas). Desse modo, o homossexual é assimilado. O movimento LGBT deve ser, antes de mais nada, uma resistência à violência e à marginalização imposta aos homossexuais por uma estrutura hierárquica e patrilinear. Mas há maneira de um grupo escapar dos efeitos do poder impostos pela disciplina? Para nós é evidentemente que sim. Agrupamentos horizontalmente, sem uma estrutura hierárquica forte, aliada a uma ausência de um critério de aceitação/composição (ainda que imposto de forma implícita), esquivam-se das redes de dominação. Neste sentido, dizer-se homossexual dentro de um conjunto sem líderes e ao mesmo composto por qualquer indivíduo de natureza subversiva; não sendo seqüestrado, dessa forma, por qualquer setor da sociedade com interesses financeiros, políticos e/ou midiáticos; deixa de ser um processo de subjetivação conveniente aos mecanismos institucionais, para ser uma resistência às práticas disciplinares

Sobre Mapas Afetivos (e dramas burgueses ruins para fins didáticos)

In mapa afetivo da cidade on abril 3, 2010 at 17:49

PRIMEIRO ATO


Casa de família, classe média. Sala de estar com TV ao centro, sofá, abajur, quadros, outros móveis e apetrechos típicos. Uma saída à esquerda leva para o corredor. À direita, a porta principal, de entrada da casa.

 

CENA I
Luther e Monty

Monty recostado no sofá lê um livro.
Luther sentado à mesa toma café e permanece muito entediado.

LUTHER
O que é um mapa afetivo da cidade?

MONTY
Pense em um mapa…

LUTHER
Pensei!

MONTY
Agora pense em um mapa sobreposto a esse mapa… o SEU mapa!

LUTHER
Esboçando uma cara de dúvida

MONTY
É mais simples do que você pensa… seu mapa teria por exemplo “pontos turísticos” da sua própria vida ou as rotas que você faz quando sai entediado pela madrugada mas não conta para ninguém.

LUTHER
Não faz o menor sentido…

MONTY
Eu sei que não, mas imagina uma cartografia dos pontos que são importantes só para você. Uma cartografia sentimental, solipsista, mas que você gostaria de compartilhar com os outros…

LUTHER
Mas esse mapa afetivo seria do leitor?

MONTY
Inicialmente não, ele é primeiro uma indicação daquele que pensa, confecciona ou faz o mapa e é justamente ao ser compartilhado que se inicia o jogo. Assim, esse mapa poderá alterar (ou não) esse “outro” que você chama de “leitor”, por exemplo, direcionando seu olhar para um ponto da cidade que passa despercebido ou revestindo um espaço comum e banal com uma história e sensação que não a dele.

LUTHER
Acho que começo a entender, mas ainda fico pensando de que forma isso poderia acontecer e ser compartilhado…

MONTY
Talvez experimentando desenhar mapas ou escrever indicações de locais que você quer compartilhar em banheiros sujos pela cidade… ou em xerox de mapas alterados, deixado nos bancos do metro, ônibus, praças…. usando a internet para divulgar anonimamente seus mapas, esperando que alguém um dia se interesse por eles. Sei lá, propondo ao seus amigos jogos idiotas de caça ao tesouro pela cidade. As possibilidades são infinitas e basta…

LUTHER
Interrompendo-o
Tá, entendi!

MONTY
… encontrar pontos importantes para cada um de nós…

LUTHER
Você escutou?! Eu já entendi!

MONTY
…. que serviriam para montar um percurso para esse “outro”, “leitor”, “jogador”.

LUTHER
Cara, você nunca sabe a hora de parar!

MONTY
Seja propondo efetivamente um percurso ou apenas um novo olhar.

LUTHER
Cala a boca!

Monty fica em silêncio.

LUTHER
Ainda me resta uma dúvida: se um mapa não é o território, o que ele é afinal?

MONTY
Eu sinceramente não sei! Longe de te dar qualquer resposta eu só queria que você parasse de me encher o saco…

Os dois riem e subitamente olham pela janela da sala, ao longe a cidade pega fogo

 

FIM